Comungar na mão é contrário a Tradição

Por D. C. A. 



O boletim de informação religiosa Mysterium Fidei, editado em Bruxelas por Alfredo Denoyelle, traz um estudo sobre a Tradição relativa a maneira de o fiel receber a Sagrada Comunhão.
Como se sabe, os inovadores que pretendem impor a nova maneira de comungar, recebendo o fiel na mão a Sagrada Partícula, apelam para a Tradição. Nos primeiros dez séculos de Cristianismo, afirmam, era assim que se comungava. E citam sobretudo a V Catequese Mistagógica de São Cirilo de Jerusalém (313 - 386).
Mysterium Fidei desfez esse equívoco à vista de vários documentos que atestavam como usual, mesmo antigamente, os fiéis receberam na língua a Partícula consagrada, bem como através de uma análise do texto de São Cirilo de Jerusalém aduzido como prova a Tradição favorável a Comunhão na mão.
Expressão inadequada, diga-se de passagem, pois que a Comunhão está na deglutição da Partícula consagrada. De onde, “Comunhão na mão” é comunhão que o fiel se dá a si mesmo, dispensando o papel do Sacerdote como ministro, em sentido estrito, desse grande Sacramento.

O uso tradicional 

O hábito de receberem na língua a Sagrada Partícula é atestado por São Leão I, Papa (404-461), pois, comentando as palavras do Senhor, relatadas no Capítulo VI de São João, vers. 54, fala São Leão Magno, como de uso corrente, em se receber a Comunhão na boca: “Recebe-se na boca o que acredita pela FéHoc enim ore sumitur quod fide creditur” (Serm. 91, 3). Note-se que a maneira de expressar-se de São Leão Magno não é a de quem introduz uma novidade e sim de quem registra um fato comum, ordinário no uso habitual da Igreja.
Semelhante uso é confirmado com o testemunho e o exemplo de São Gregório Magno, Papa de 590 a 604. Conta ele, nos seus Diálogos (III, c. 3) como o Papa Santo Agapito operou um milagre, durante a Missa, depois de ter introduzido o Corpo do Senhor na boca da pessoa. E João Diácono, na vida do mesmo Santo Papa, nos assegura que desta maneira distribuía ele a Comunhão aos fiéis.
São testemunhos do século V e VI. Como se pode afirmar que a Comunhão na mão foi a primeira oficial de comungarem os fiéis até o século X?

A exceção

De fato, nos primeiros séculos, apenas excepcionalmente, quando um motivo grave deixava o fiel na alternativa de ou não comungar, ou comungar por si mesmo, permitia-se a Comunhão na mão. São Basílio (330 – 379) diz claramente que comungar com a própria mão só é permitido em tempo de perseguição, ou – como acontecia com os monges do deserto – quando não havia Padre ou Diácono para administrá-la: “não é preciso mostrar que não constitui falta grave a pessoa comungar com suas próprias mãos, em tempo de perseguição, quando não há Sacerdote ou Diácono” (Carta 93, grifo nosso). E o santo baseava sua opinião onde não há Padre, de conservarem em casa a Comunhão que tomam com suas próprias mãos.
Este trecho de São Basílio considera tão irregular a Comunhão na mão, que não duvida considerá-la “falta grave”, quando não há circunstância excepcionais que a justificam. Leclerq (Dict. d' Archéologie chrétiene, verb, Communion) declara que, com a paz concedida a Igreja por Constantino, foi cessando o uso da Comunhão da mão, confirmando a afirmação de São Basílio que as perseguições criavam a alternativa de ou não comungar, ou comungar com as próprias mãos.

Os abusos

A sobrevivência daquele hábito em alguns lugares foi considerada abuso, e em desarmonia com o costume dos Apóstolos. Provam-nos as medidas tomadas em várias regiões para coibi-la. Assim, diz o Concílio de Ruão, reunido por volta de 650: “A nenhum leigo ou mulher se lhe ponha a Eucaristia na mão, mas somente na boca”. Semelhante medida tomou também o Concílio de Constantinopla (692), conhecido com in trullo, proibindo os fiéis de se comungarem a si próprios (o que se dá quando a Sagrada Partícula é colocada na mão do comungante), e pune, os que o fizerem, estando presente um Bispo, um Padre ou um Diácono.

Numa localidade holandesa: cada assistente comunga um pedaço de biscoito

Já no século III, São Eutiquiano, Papa de 275 – 283, adverte severamente os Padres, exortando-os a levarem eles mesmos a Comunhão aos doentes, e a não confiarem este mister a um leigo ou mulher: “Nullus praesumat tradere communionem laico vel faminae ad deferendum infirmo” (P.L.V., col. 163 – 168).
Santo Tomás de Aquino (S.T. 3 a. 82, a. 3) dá-nos a razão: "A administração do Corpo de Cristo compete ao Padre por três motivos... Em terceiro lugar pelo respeito que se deve a este Sacramento, não é Ele tocado por nada que não seja consagrado. Eis o motivo porque o corporal e o cálice são consagrados, e semelhante, as mãos do Sacerdote são consagradas para tocar este Sacramento. Assim, nenhuma outra pessoa tem o direito de tocá-lo a não ser em caso de necessidade, por exemplo, se o Sacramento cai no chão, ou em necessidade semelhante”.
O Concílio de Trento declarou que o costume de somente os Sacerdotes comungarem eles mesmos com as próprias mãos é de tradição apostólica (s. 13, c.8).

O Catecismo de São Pio X

Resumindo esta imemorial tradição, o Catecismo de São Pio X dá a seguinte norma para o fiel comungar: "No momento de receber a Santa Comunhão, é preciso estar de joelhos, ter a cabeça um pouco levantada, os olhos modestamente voltados para a Sagrada Hóstia, a boca suficientemente aberta e a língua um pouco fora pousando sobre o lábio inferior... É preciso haver uma toalha ou paterna de maneira que a receba a Sagrada Hóstia, caso ela venha a cair... Se a Sagrada Hóstia se prende ao paladar, é preciso desprendê-la com a língua, e jamais com o dedo" (P. IV, c. IV, § 40)

Origem do abuso: o arianismo

Não obstante, a documentação conciliar dos séculos passados, ao coibir a Comunhão na mão, atesta que a semelhante maneira de comungar se tinha infiltrado em vários lugares. De onde veio o abuso, se não tem origem apostólica?
Observa Mysterium Fidei: "Os únicos a comungar sempre de pé e com a mão foram, desde o começo, os arianos que negavam obstinadamente a Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, e que não podiam ver na SS. Eucaristia mais do que um simples símbolo de união. Podendo ser tomado e manipulado a vontade".

A V Catequese de S. Cirilo

É neste contexto que se insere a V Catequese Mistagógica de São Cirilo de Jerusalém, testemunho a que apelam os progressistas para imporem, como mais apostólico, o hábito de comungar na mão.
D. Henrique Leclerq (Dict. Citado) a resume assim "São Cirilo de Jerusalém recomendava aos fiéis que ao se apresentam para comungar, tivessem a mão direita estendida, como os dedos juntos, sustentada pela mão esquerda, e com a palma um pouco côncava; no momento em que nela se depositava o Corpo de Cristo, o comungante dizia: Amén".

    - Que quer dizer este texto?

- Tomando-o no contexto, ele se torna suspeito. Pois, fala de um costume estranho, inteiramente alheio a veneração suma, em que os fiéis tiveram sempre o SS. Sacramento da Eucaristia. Diz, de fato, a catequese que se devem tocar os olhos com a Sagrada Hóstia: "Santifica teus olhos pelo contato do Santo Corpo", e, depois, com os dedos umedecidos no SS. Sangue, passá-los nos olhos, na fronte e nos outros sentidos para santificá-los: "Quando teus lábios estiverem ainda molhados (após tomarem o SS. Sangue), toca-os com tuas mãos e passa sobre teus olhos, tua fronte e todos os outros sentidos, para santificá-los".
- A vista de uma liberdade inédita e incompatível com toda a reverência devidas as Sagradas Espécies, os entendidos pensam numa interpolação, ao menos, do texto de São Cirilo de Jerusalém. Alguns (Scherman, Exans, Richard, Teifer) atribuem o texto ao sucessor de São Cirilo: outros (Cross) pensam num texto primitivo de São Cirilo, retocado pelo sucessor. Como há códices que o atribuem a São Cirilo e ao seu sucessor, pode-se pensar numa acomodação feita pelo Patriarca João, sucessor de São Cirilo em Jerusalém.
Ora, esse Patriarca João, segundo correspondência de São Epifânio, São Jerônimo e Santo Agostinho, é de ortodoxia suspeita. Mysterium Fidei chamao-o de cripto-ariano.
- Já o editor – Migne – das Catequeses Mistagógicas de São Cirilo, advertia, no prefácio, que sob o ponto de vista litúrgico, elas têm muito de comum com as Constituições Apostólicas. Acontece que as Constituições Apostólicas estão infiltradas de erros, devidos ao seu autor, um sírio semi-ariano. O mesmo se deve dizer dos Cânones Apostólicos que são a última parte das Constituições. Por isso, foram eles rejeitados pelo Concílio de Roma, de 494, sob o Papa São Gelásio I (492 – 496).
Recolocadas nesse contexto histórico, vê-se que as Catequeses Mistagógicas de São Cirilo não podem, elas só, serem propostas como testemunho autêntico dos usos tradicionais da Igreja. No caso da Comunhão na mão, elas contradizem o uso atestado por autores sobre os quais não paira nenhuma suspeita.

Conclusão

As observações acima mostram como se distanciam da verdade histórica os progressistas que pretendem justificar a comunhão na mão por isso que teria sido a maneira comum de comungar nos dez primeiros séculos de Cristianismo.
Como foram os arianos que se empenharam por introduzir tiros litúrgicos minimalizantes do caráter sagrado e divino da SS. Eucaristia, assim mostram hoje um obscurecimento da Fé na Presença real aqueles que alegremente se adaptam as inovações, como a Comunhão na mão, apesar da palavra da Santa Sé afirmar que a maneira tradicional de comungar indica maior reverência do comungante para com a SS. Eucaristia, e faça parte daquela preparação que se requer que o Corpo e o Sangue do Senhor seja recebidos com o máximo fruto (cfr. Memoriale Domini). 



Este artigo foi transcrito pelo Cruzado Conservador. Ave Maria! Deus Vult!

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

12 citações contra a sodomia que todos os católicos deveriam conhecer

Algumas vestes litúrgicas negras únicas para o dia de finados